quarta-feira, junho 18

A resposta de Capitolina

Suíça, 18 de Fevereiro de 1885.


Bento,

Hoje faz 20 anos que nos casamos aí no Rio de Janeiro e 10 que você nos despachou (a mim e ao pequeno Ezequiel) para tão longe.

Escrevo não porque sinto saudade, tampouco piedade. Nosso amor acabou. Escrevo porque me descobri doente, condenada à morte pelos médicos. Estou quase desenganada. E antes que seja tarde demais, desejo fazer alguns esclarecimentos para o meu próprio bem.

Eu sei que você até hoje desconfia que eu te traí com o Escobar. Foi por isso que me mandou para cá. Sei também que ainda cogita a possibilidade de não ser o verdadeiro pai do menino, que inclusive vê semelhanças entre os dois. Que passou as duas últimas décadas atormentado por essa suspeita.

Nesse momento você deve estar se perguntando: “Como aquela louca dissimulada sabe de tudo isso? E eu te digo, Bento, uma mulher ferida na honra sabe de tudo. Ela conhece com o olhar, mesmo que se cale pra sempre.

A sua mudez de reprovação me contou a história toda. Durante anos os seus olhares de desconfiança fulminaram a minha moral ao ponto de eu me sentir culpada pelo que nunca havia feito. As suas poucas palavras, incertas dos fatos e certeiras no ataque, atingiram-me como flechas de dor. Chorei o tempo todo. Quieta.

Você me condenou com sua ofensa velada e insegurança confessa. E hoje quem te confessa sou eu: Bento Santiago, eu não te traí, nem em pensamento. Mas, com meu silêncio, eu me vinguei. Fazer você morrer de incerteza e ciúme foi a única saída que me sobrou.

Se eu te corneasse de fato, a razão seria sua. Se eu te implorasse a fé, você me acusaria de confissão. Então, preferi me calar para ocultar a verdade e revidar com o fel da dúvida todo o ressentimento que você me causou.

Pronto, agora morro em paz. Envenenada pelo meu próprio segredo. Em paz e livre.

E te liberto também,


Adeus, 
Capitu
              
Bianca Sabatino

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